quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

quarta-feira, 1 de novembro de 2017



"Assim sofria e me torturava, acusando a mim mesmo com mais dureza do que nunca, revirando-me e debatendo-me para romper definitivamente o laço que já me prendia apenas por um fio; mas ainda me prendia. E tu me pressionavas por dentro, Senhor, com misericórdia severa, alternando os flagelos do medo e da vergonha, para que não desistisse de novo e não deixasse de romper aquele laço exíguo e tênue que ainda restara, e ele não voltasse a se fortalecer e a me prender com maior força. Pois eu dizia dentro de mim: "Agora vai acontecer, agora vai", e já ia me dispondo conforme minhas palavras. E quase me decidia, e não me decidia, porém não recaía na situação anterior, ficava perto e retomava o fôlego. Voltava a tentar e por pouco não chegava lá e por pouco, já, já, não alcançava nem conseguia, hesitando em morrer para a morte e em viver para a vida, e dentro de mim o que era pior, porém familiar, tinha mais força do que o melhor, mas insólito, e aquele preciso instante em que algo novo aconteceria, quanto mais se aproximava, tanto mais me despertava repulsa; mas não recuava nem me esquivava, apenas permanecia em suspenso."

Confissões, Santo Agostinho

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Sobre o livro "Cinefilia" de Antoine De Baecque



Por Bruno Andrade


(os comentários a seguir foram originalmente publicados aqui)

É necessário, antes, lembrar que o De Baecque já havia tentado (rascunhado, truncado, falhado) uma história dos Cahiers nos dois tomos Histoire d'une révue - o primeiro ia de 51 a 59, o segundo de 59 a 81 -, provocando reações virulentas entre vários redatores antigos da revista. O Rohmer em particular chegou a contestar publicamente o trabalho do De Baecque. E com toda a razão, em vista dos mitos e invenções que mesmo hoje ainda rondam o trabalho editorial que ele fez com o Doniol-Valcroze e o Douchet - sem dúvida alguma para quem conhece a história dos Cahiers a melhor editoria que a revista teve e que, ao contrário de um dos mitos que ainda perduram, nada teve a ver com a entrada do macmahonismo ou de um pensamento estético "à direita" na revista, exemplo típico de desinformação fundada em pura ignorância -, clichês vagos e procedentes de imprecisões que o De Baecque não fez que repetir no Histoire, e parcialmente - ou atenuadamente pelo menos, visto que a pesquisa que fez desta vez foi muito mais profunda e precisa - no Cinefilia.

Aproveito a menção para começar a discutir os deméritos que vi no livro: excessos sempre houveram na história dos Cahiers, desde o início, e é possível que ainda mais nas editorias que seguiram as do Rohmer - Rivette, Narboni-Comolli etc.; em textos como os que Fieschi, Jacques Bontemps, Labarthe ou Luc Moullet escreveram entre 65 a 68 -, mas o De Baecque mais uma vez centra suas observações à versão já historicizada, legitimada, de que os excessos questionáveis e realmente dignos de intervenção se restringem principalmente à abertura intelectual (porém vigilante, muito mais que a do Rivette ou dos que os seguiram) permitida pelo Rohmer entre 59 e 62-63. Então, além de parcial e desonesto, eu diria também que é tendencioso, ainda mais para um trabalho feito por um "historiador", na realidade feito para legitimar a visão intelectualmente correta (mais para "corrigida") de que os Cahiers se corrigiram e seguiram se corrigindo, policiados, dos seus excessos políticos a partir da entrada do Rivette na revista e da 'politização' que se intensifica depois de 66 e 67 (como se a revista que criou a POLÍTICA dos autores e tinha nas suas páginas Pierre Kast e Louis Marcorelles, além de Godard e o próprio Rivette, fosse 'despolitizada' antes da intervenção rivettiana). Não sei se, lendo o livro, a pessoa que não conhece os Cahiers amarelos tem a real noção do que a revista de fato foi no início dos anos 60, único momento em que se viu a intransigência inicial dos jovens turcos aliada à grandeza de espírito do Rohmer, que admitiu no interior da revista uma multitude de formas e enfoques válidos (para ter uma boa noção da filosofia da revista nesse momento, recomendo as leituras dos textos centrais do Jean Douchet, A Arte de Amar, e do Rohmer, O Gosto da Beleza).

Parcial: em basicamente toda a cronologia que ele fornece, do surgimento da cinefilia aos seus desenvolvimentos inusitados nos anos 50, ele centra essa "história da cinefilia" quase que integralmente nas figuras, sem dúvida alguma estimáveis e em alguns casos inestimáveis, daqueles que passaram pelas revistas e pelos semanários, o que de forma alguma dá a real noção dos papéis exercidos nessa história por algumas de suas figuras mais verdadeiramente atuantes. Pergunta: e quantos aos Cineclubes, os programadores, os cineclubistas? Quase nenhuma, em alguns casos até mesmo nenhuma, ou ainda nada mais que uma rápida menção a Philippe Demonsablon, Gérard Legrand (tão bom ou até melhor que o Tailleur dentre os redatores da Positif), Dominique Rabourdin, Jacques Goimard, Michel Fabre, Pierre Maginot, Georges Richard, Simon Mizrahi, Jean-Claude Missiaen, Pierre-Richard Bré, Barbet Schroeder, Jean-Loup Passek, Pierre Cottrell, Yves Boisset, Patrick Deval, François Weyergans, Jean-Pierre Coursodon, Jean-Claude Romer, Jacques Siclier, Patrick Brion, Jean-Louis Cheray, Pierre Guinle, Gérard Guégan, Jean Collet, Michel Caën, Jean Rollin, Claude-Jean Philippe etc. (não lembro o quanto ele fala ou não do Bernard Eisenchitz ou do Henri Agel, este último professor do Serge Daney, do Louis Skorecki, do Biette, "pai cultural" do Jean-Claude Guiguet, em suma uma das influências mais significativas de alguns dos críticos mais importantes saídos da França nos últimos 50 anos; se não fala é mais uma omissão gravíssima, e se fala pouco é uma opção infeliz) e, no caso dos Cineclubes, às atividades do Studio-Action République, do Nickel-Odéon, da Midi Minuit Fantastique (revista com intensas atividades cineclubistas)... Não lembro se ele chega a falar do Studio Parnasse ou do Ciné-club du Louvre, o que é também um péssimo sinal. (Lembrando que, para além do recorte obrigatoriamente adotado por questões práticas pelo De Baecque, tudo isso que eu citei acima não ocorre apenas em Paris e paralelamente ou transversalmente você localiza na Itália, em Portugal, na Espanha, na Inglaterra etc. trabalhos igualmente imprescindíveis como os do Adriano Aprà, Freddy Buache, João Bénard da Costa, José Luis Guarner, Miguel Marías, V.F. Perkins, Kevin Bronwlow, Peter von Bagh e certamente mais uma porrada.) Uma coisa que particularmente não entendo é o sujeito passar umas dez páginas falando do trabalho do Bernard Dort no meio dessa "grande história da cinefilia" e despachar o macmahonismo, um movimento que está na origem - 1951 - da atuação dos jovens turcos e de toda essa efervescência cinefílica que em poucos anos tomará Paris, além de ter uma importância considerável na história crítica e estética dos Cahiers, em pouco mais de três páginas. Isso realmente está além das minhas capacidades.

O que me traz à questão da desonestidade. Realmente acho que há apenas duas opções de julgamento para a leitura feita pelo De Baecque do texto do Lourcelles sobre Fuller: ou você considera aquilo um equívoco completo ou, no caso dele ter de fato lido o texto, acha aquilo desprezível. "Exaltação viril da figura do herói em Fuller"... Sinceramente: ele sequer leu o texto, para início de conversa, ou nem mesmo passou do título que cita Borges e do qual Lourcelles extrai principalmente a noção de traidor para discutir a obra do Fuller? De Baecque não estaria confundindo oportunamente as prosas do Mourlet ou de um Serguine à de um Lourcelles, nesse equívoco que dura há horas e que faz com que se considere o macmahonismo como algo próximo de uma doutrina, uma corrente uniforme de pontos-de-vista unívocos, imutáveis e inequivocadamente alinhados ao invés do mais alto grau de uma expressão da paixão indolente e intransigente que está na base de qualquer cinefilia digna do nome? Não estaria De Baecque apenas prolongando, como vários redatores das gerações que sucederam a editoria Rohmer-Douchet, a confusão que faz com que se rechace um dos capítulos mais importantes da história da crítica cinematográfica, e que acontece não nas páginas dos Cahiers mas nas da Présence du Cinéma (e que, até por isso, talvez merecesse um pouquinho mais que três páginas)? Essa oposição instigada pelo De Baecque das visões dos Cahiers e da Présence sobre um mesmo cineasta crucial para as duas revistas só não é mais falsa que inexistente: qualquer pessoa que leu atentamente o texto do Lourcelles conclui que o que ele escreve sobre Merrill's Marauders e A Lei dos Marginais problematiza e prolonga as questões levantadas pelo texto do Moullet, especificamente na questão da modernidade no cinema do Fuller e na relação dessa modernidade evidente com o resto do cinema americano. São textos muito mais convergentes que divergentes, e a principal diferença entre os dois é que um foi escrito em 59, com a visão que era possível de se ter do cinema do Fuller até então, e o outro em 64 com uma perspectiva arejada por filmes como A Lei dos Marginais e principalmente Merrill's Marauders (que antecede e anuncia, vale lembrar, Agonia e Glória, desdobramento último, terminal da porção da obra do Fuller comentada por Moullet e Lourcelles). Uma diferença que o De Baecque não chega a desenvolver ou sequer aventar, e que entretanto não é nem um pouco negligenciável.

Mas nem foi isso o que mais me incomodou dentre o que eu vi como desonestidade no livro. O que realmente me deixou negativamente surpreso foi a síntese que ele encontrou para a sobrevida ou a consciência aguda da cinefilia após a "queda" desta nos idos de 68. Essa eleição do Daney como figura intransponível da melancolia cinefílica (que na história recente dos Cahiers dá-se na forma de um endeusamento que chega em alguns momentos a assumir a forma incômoda e desnecessária de uma necrologia) não só é caduca como falsa. COMO o sujeito faz uma súmula dessa consciência do impasse ao qual a cinefilia se encaminhou a partir dos anos 60 sem mencionar extensamente um texto que se chama, justamente, Contra a Nova Cinefilia, cuja autoria não é de Serge Daney mas sim de Louis Skorecki? Como o sujeito faz uma pesquisa tão complexa, que teve acesso privilegiado a documentos inéditos ou de acesso restritíssimo, e conclui o livro sobre a reflexão específica de um crítico sem mencionar que essa reflexão teve origem nas idéias de um texto escrito não por ele mas por um de seus colegas, um dos que ele mais foi próximo? (Não coincidentemente Skorecki deixou o Cahiers pelo Libération na mesma época que o Daney, acho que inclusive antes, e começou a escrever sobre TV antes do Daney.) Não só Skorecki mas também Jean-Claude Biette, Guiguet (que não escreveu para os Cahiers mas que fez muito desse mesmo trabalho de continuidade e problematização da herança cinefílica), Michel Marmin; os textos que Skorecki e Daney escreveram no Libération sobre as reapresentações de filmes clássicos (continuação de um trabalho iniciado na realidade pelo próprio Skorecki e por Biette nos Cahiers ainda nos anos 70, por sinal); os textos seminais que o Biette escreveu nas seções Les fantômes du permanent e Cinéma-chroniques nos Cahiers, que ecoam e muitas vezes respondem provocantemente várias das questões levantadas por Daney e Skorecki à época, de uma maneira muitas vezes ainda mais instigante que o Daney, um material que é freqüentemente tão bom ou até melhor que o que Daney produzia na época; ou ainda esses loucos prospectores do tipo Pierre Rissient, Simon Mizrahi, que peregrinaram a Ásia e a Itália atrás dos jovens cineastas ou das descobertas tardias, que não escrevem ou escrevem muito pouco; a história da famosa sessão organizada pelo Paulo Branco no Action République do Amor de Perdição à qual se deve a consagração definitiva do Oliveira na França; toda uma série de episódios os quais conheço ou ouvi falar. Isso me parece apenas má-fé mesmo, vontade de agradar os caciques (Aumont, Toubiana, Bergala, Bonitzer, não por acaso acionistas da revista e sujeitos que, mesmo que se admire o que eles escrevem, têm uma relação muito problemática com a história da mesma e com certas figuras como Skorecki e Biette), de fazer revisionismo, de terminar com uma "biografia autorizada" ao invés do extenso trabalho de historiador que poderia ter sido. O capítulo da cinefilia após 68 é de longe a maior furada desse livro cheio de furadas, mais pela ausência de um comentário que fosse sobre o texto do Skorecki ou os do Biette que por todas as outras coisas que citei.

Para tomar conhecimento de algumas das coisas que o De Baecque flagrantemente deixou passar, recomendo as leituras de Mes Voyages en Cinéphilie do Michel Mourlet; a mítica tese de mestrado da Geneviève Puertas (la Cinéphilie à Paris 1954-1966); a entrevista que o Skorecki deu pros Inrockuptibles e que se encontra online; o blog do Patrick Brion; um texto, acho que do Claude Beylie, sobre MacMahonismo que tem em .pdf; uma entrevista que o Rohmer deu para os Inrockuptibles em 5 de junho de 1996; e, principalmente, o Contra a Nova Cinefilia, que se acha com facilidade na web.

Em suma: fora essa sensação que o livro acaba passando no seu recorte 51-68, de que 'enquanto os anos avançaram a coisa mudou porque era necessariamente melhor assim', essa passividade típica da geração que veio na cola dos Aumont, dos Toubiana e dos Bonitzer, sensação profundamente enganosa, eu diria que dentro do trabalho que o De Baecque teve a chance de fazer o livro não chega a corresponder nem a 40% do que poderia ter sido. Sério candidato ao título de leitura mais decepcionante de 2011.

domingo, 24 de setembro de 2017

"The sharpest battle of the intellectual war occurred in 1937, when Nancy Cunard and a group of other Left-wing writers in Paris (including the young British poets W. H. Auden and Stephen Spender) sent out a questionnaire to 200 writers in Europe, with this provocative content: “Are you for, or against, the legal government and people of Republican Spain? Are you for, or against, Franco and Fascism? For it is impossible any longer to take no side.” The confrontational questionnaire elicited 147 answers, the overwhelming majority of which–126–supported the Republic. Five writers explicitly responded in favor of Franco (among them the novelist Evelyn Waugh and the WWI poet Edmund Blunden). Among sixteen responses that Cunard, in her eventually published compendium, grouped under the skeptical heading “Neutral?” were those of some of the most famous writers of the age: H. G. Wells, Aldous Huxley, Ezra Pound (even at this time deeply involved in the Italian Fascist party), and the Anglo-American poet T. S. Eliot. Since the mid-1930s was not an era where attempts at neutrality would be tolerated, these writers were taken either as morally weak and equivocal or as mere closet Fascists trying to protect their reputations. In fact, several of them were either equivocal or Fascist or both. Not so with T. S. Eliot.

Eliot’s actual response, in fact, is a distillation of a much broader and more penetrating agenda, which he spent the last half of his life pursuing. He wrote this response to Cunard: “While I am naturally sympathetic, I still feel convinced that it is best that at least a few men of letters remain silent.” Rather than a deft side-stepping of the issue, what Eliot offers here is the credo that he had been developing since his conversion to Christianity and entrance into the Anglican Church in 1927: a socio-political version of the Anglican theological tenet know as via media."

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

sexta-feira, 16 de junho de 2017

Seria Snake Eyes o L'argent do De Palma?


quinta-feira, 15 de junho de 2017

Desses detalhes que não são detalhes, mas que só são notados depois de algumas dezenas de revisões: em Carlito's Way, nunca vemos a casa de Al Pacino. O que chega mais perto disso é a boate que ele gerencia, cuja decoração remete ao interior de um navio. Nada mais apropriado para ele, personagem que vive à procura de um lugar para ancorar-se e repousar.


quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

"É muito natural que, quando nos tivermos entregue aos movimentos ordenados que uma grande peça ou narrativa estimula em nós - quando tivermos dançado aquela dança, respeitado aquele ritual ou obedecido àquele ritmo - isso nos sugeriria várias reflexões interessantes. Graças a essa atividade "desenvolvemos a musculatura mental". Podemos agradecer a Dante ou a Shakespeare por esses músculos, mas será melhor não lhes atribuir a paternidade do uso filosófico ou ético que fazemos disso. Por um lado, esse uso não crescerá muito - pode crescer um pouco - acima de nosso nível habitual. Muitos dos comentários sobre a vida que as pessoas extraem de Shakespeare poderiam ser alcançados até por aqueles de pouco talento sem o auxílio do escritor. Por outro lado, poderá impedir futuras recepções da própria obra. Poderemos voltar a ela especialmente para confirmar nossa crença de que ensina isto ou aquilo, mais do que para uma renovada imersão no que ela é de fato. Devemos ser como o homem que atiça o fogo não para ferver a água ou aquecer um ambiente, mas na esperança de nele ver as mesmas imagens que viu no dia anterior. E, uma vez que um texto, para um determinado crítico, não é mais do que "uma luva de pelica" - já que tudo pode ser um símbolo, uma ironia ou uma ambigüidade -, deveremos achar facilmente o que queremos. A suprema objeção a isso é que se ergue contra o uso popular de todas as artes. Estamos tão ocupados atuando sobre a obra que damos a ela pouca chance de atuar sobre nós. E é assim que, cada vez mais, encontramos apenas a nós mesmos." 

C. S. Lewis - Um experimento na crítica literária

sábado, 7 de janeiro de 2017

Sully (Clint Eastwood, 2016)


A primeira cena de Sully é um pesadelo. O piloto sonha que o avião cai no meio de Nova York. As últimas palavras dele são uma derradeira declaração de amor à esposa.

Na primeira sessão sobre o evento do pouso no rio Hudson, questionam-no justamente a respeito do casamento. Ele parece constrangido pela pergunta e, ao dizer que os problemas que possui são iguais aos de outras pessoas, parece esconder que no fundo a relação lhe causa, sim, preocupações.

A personagem da esposa de Sully é trazida ao filme em outros momentos, sempre separada fisicamente do protagonista. Eles conversam por telefone, ela reclama dos repórteres que batem com insistência à porta e do fato de a vida deles ter sido virada pelo avesso.

A relação de Sully com a esposa é o primeiro de uma série de círculos concêntricos que exploram o fato de haver uma desordem em cena: o próprio piloto (espécie de Jó), apesar dos vários anos de experiência, passa a se colocar em questão e duvidar da proeza que realizou; além disso, há um país inteiro cuja ferida aberta pelo 11 de setembro não havia ainda sido cicatrizada.

O filme de Clint Eastwood é a história de uma restauração, em vários níveis: Sully, ao final, sente orgulho daquilo que foi capaz de fazer e, através da sua história, o país volta a poder olhar para o céu com esperança e pensar que nem só os anjos têm asas  - ou que anjos existem, mas nem todos as possuem.

O filme, porém, não conclui a história de Sully com a esposa. Desde a primeira cena havia sido criada uma expectativa pelo reencontro de ambos, a superação da distância, o abraço, o retorno à normalidade, a porta fechando nas suas costas, o inverso, enfim, do final de Rastros de Ódio, ao qual Eastwood já se remeteu alguma vezes em sua obra. Não veio.