"É muito natural que, quando nos tivermos entregue aos movimentos ordenados que uma grande peça ou narrativa estimula em nós - quando tivermos dançado aquela dança, respeitado aquele ritual ou obedecido àquele ritmo - isso nos sugeriria várias reflexões interessantes. Graças a essa atividade "desenvolvemos a musculatura mental". Podemos agradecer a Dante ou a Shakespeare por esses músculos, mas será melhor não lhes atribuir a paternidade do uso filosófico ou ético que fazemos disso. Por um lado, esse uso não crescerá muito - pode crescer um pouco - acima de nosso nível habitual. Muitos dos comentários sobre a vida que as pessoas extraem de Shakespeare poderiam ser alcançados até por aqueles de pouco talento sem o auxílio do escritor. Por outro lado, poderá impedir futuras recepções da própria obra. Poderemos voltar a ela especialmente para confirmar nossa crença de que ensina isto ou aquilo, mais do que para uma renovada imersão no que ela é de fato. Devemos ser como o homem que atiça o fogo não para ferver a água ou aquecer um ambiente, mas na esperança de nele ver as mesmas imagens que viu no dia anterior. E, uma vez que um texto, para um determinado crítico, não é mais do que "uma luva de pelica" - já que tudo pode ser um símbolo, uma ironia ou uma ambigüidade -, deveremos achar facilmente o que queremos. A suprema objeção a isso é que se ergue contra o uso popular de todas as artes. Estamos tão ocupados atuando sobre a obra que damos a ela pouca chance de atuar sobre nós. E é assim que, cada vez mais, encontramos apenas a nós mesmos."
C. S. Lewis - Um experimento na crítica literária